Por estes dias, todos lutam por um lugar ao sol.
No caso específico de Amor, por um lugar na parede, junto às fotografias dos antigos presidentes de junta.
Por terras de Amor, com coletividades tão ativas, é fácil crescer-se imbuído do espírito que se pode fazer mais — no clube, na festa, nos escuteiros, na assembleia — que podem, e devem, um dia candidatar-se a ocupar o cargo que lidera os destinos da freguesia.
Mas trará o cargo assim tanta liberdade de ação como muitos julgam?
O que se pode fazer na Junta?
As competências que uma Junta de Freguesia tem têm aumentado ao longo da última década, num processo de transferência que tem partido do poder central para o poder autárquico local. A listagem do que se pode fazer varia ao longo do país, com certas câmaras municipais a não aceitarem certas obrigações que os ministérios querem-lhes dar, ou outras a manterem sob o seu aval, em vez de as passarem às juntas de freguesia. No entanto, existem competências inerentes a todas as juntas cimentadas em leis próprias.
Para além do óbvio — gerir os serviços, os recursos humanos e administrar e conservar o património da freguesia —, em Amor, a Junta pode adquirir, alienar ou onerar bens imóveis cujo valor esteja avaliado até pouco mais de 1 milhão e duzentos mil euros. É também a sua obrigação executar as deliberações da assembleia de freguesia, elaborar e executar um plano de trabalho e orçamento anual, colaborar com a câmara municipal no inquérito público dos planos municipais do ordenamento do território, pronunciar-se sobre projetos de construção e de ocupação da via pública (sempre que tal lhe for requerido pela câmara municipal) ou executar (por empreitada ou administração direta) as obras que constem do plano anual e para a qual tenham sido aprovadas verbas no orçamento. Mas este plano e este orçamento têm de se aprovados em assembleia de freguesia, daí a importância de que se confiar nas restantes pessoas que compõem as listas que se apresentam nestas eleições.
Às responsabilidades da junta ainda se somam a gestão de parques públicos (como o parque de merendas), de sanitários públicos, os abrigos de passageiros (paragens de autocarro), os cemitérios, ajudar nos Censos, fornecer material de limpeza e de expediente às escolas do 1.º ciclo do ensino básico e estabelecimentos de educação pré-escolar, proceder ao registo e ao licenciamento de canídeos e gatídeos, ou apoiar ou comparticipar atividades de interesse da freguesia, de natureza social, cultural, educativa, desportiva, recreativa ou outra.
Estas competências são apenas algumas inerentes ao trabalho da Junta de Freguesia, e poderão estar associadas às decisões de um novo presidente.
Para além de tudo isto, existem ainda obrigações que lhe foram (ou podem ser delegadas) pela Câmara Municipal, como a manutenção das escolas e dos jardins de infância ou a gestão das faixas de combustível.
E há dinheiro para tudo isso?
Todas as atividades referidas antes, a maioria onerosas para a junta, têm de estar inseridas num orçamento anual que, para além de ter de ser aprovado pela assembleia de freguesia, tem de ser enviado e aprovado pelo Tribunal de Contas.
As receitas próprias — dinheiro cobrado diretamente pelos serviços locais para a execução de algum serviço, seja uma licença animal ou algo relacionado com um cemitério — numa junta são relativamente poucas, e é difícil “imaginar” mais lugares onde se possa ir buscar mais dinheiro. Em Amor, em 2020, as receitas próprias foram apenas 19,95% do dinheiro que a junta recebeu e pode gastar. O resto, veio “de fora”.
Percentagem do Imposto Municipal sobre Imóveis ou as verbas do Fundo de Financiamento das Freguesias — verbas destinadas diretamente para as freguesias já inscritas no Orçamento de Estado — são valores importantes que vêm ajudar no orçamento local, mas em certos anos o maior financiador dos trabalhos numa junta como a de Amor é mesmo a Câmara Municipal.
Foi isso que aconteceu em 2020, quando as verbas provenientes do Município de Leiria ascenderam a 58,81% do orçamento anual da Junta de Freguesia de Amor. Esta percentagem não era tão elevada desde 2012, quando os valores ascenderam a 66,83%.
Existe, no entanto, uma grande diferença entre 2020 e 2012: a quantidade de dinheiro à qual aquela percentagem diz respeito. Em 2012, os tais 66,83% corresponderam a uma ajuda camarária de pouco mais 240 mil euros. Já em 2020, os 58,81% corresponderam a 656 mil euros, quase três vezes mais que oito anos antes.
Se há algo comum aos últimos quatro/cinco anos, é a tendência para se encontrar na Junta de Freguesia de Amor orçamentos cada vez maiores.
Entre 2017 e 2020 (os dados relativos a 2021 ainda não são públicos), o valor médio do orçamento executado pela Junta de Freguesia de Amor ronda os 521 mil euros. Nos quatro anos anteriores, a média fora de 306 mil euros. Um acréscimo de quase 50%. Mas estas diferenças não se justificam pela “cor da junta”. Não existe uma grande variação nos valores desde 2005 até 2017. As principais diferenças são duas: o maior número de competências (obrigações) que têm sido transferidas para a Junta de Freguesia ano após ano — e para tal precisa que lhe seja transferido dinheiro para as executar —, mas também, como é o caso em Leiria, da maior disponibilidade financeira que o município tem — em especial desde que acabou de pagar o empréstimo que existia pelas obras do estádio municipal para o Euro 2004.